Tem maus fígados - Transplante Hepático

10-08-2023
Escultura de Américo Martins simbolizando a doação
Escultura de Américo Martins simbolizando a doação

Um transplante de fígado é uma cirurgia que consiste na substituição de um fígado doente, por um fígado normal. O órgão a transplantar pode ser de cadáver após morte cerebral ou parte de fígado de dador vivo. Quando o dador vivo dá parte do seu fígado a um familiar / amigo, a parte restante e a parte doada regeneram, isto é, aumentam de volume para cumprirem a sua função.

Um transplante de fígado deve ser efetuado quando esgotados todos os tratamentos médicos e ou cirúrgicos para tratar o doente, ou em situações limite de "Falência Hepática Fulminante", que põem em risco a sobrevivência do doente.

As doenças mais comuns que poderão ter indicação para fazer um transplante hepático são: Cirrose Hepática e Tumor do Fígado, as hepatites virais C e B, doenças metabólicas – hemocromatose, fígado gordo e as doenças autoimunes e colangiopatias (Cirrose Biliar Primária, Hepatite Autoimune e a Colangite Esclerosante.

Todas estas doenças poderão evoluir para "Cirrose Hepática Descompensada", que se caracteriza por vários sintomas. Nestas situações de agravamento clinico do doente o fígado não consegue cumprir a suas principais funções, nomeadamente eliminar as substâncias tóxicas do organismo e produzir os fatores responsáveis pela coagulação do sangue.

Os principais sintomas são:

- Icterícia, que se traduz na cor amarela da pele e dos olhos e urina muito escura;

- Edemas – (Inchaço) mais acentuados nos membros inferiores e no abdómen (Barriga de água/ Ascite);

- Encefalopatia (Alterações do estado de consciência). Este sintoma aparece quando o fígado já não consegue metabolizar as substâncias tóxicas produzidas no nosso organismo e algumas depositam-se no cérebro, podendo dar quadros clínicos de agitação, agressividade, tremor das mãos e até perda da consciência/ coma.

No nosso país existe uma doença – chamada doença dos pezinhos (PAF) chamada assim, porque numa primeira fase afeta os membros inferiores. Em determinada fase da sua evolução também tem indicação para substituição do fígado. A causa é uma alteração genética, que conduz à produção de uma proteína anormal, produzida fundamentalmente pelo fígado a transterritina (TTR). Esta proteína ao depositar-se no Sistema Nervoso Periférico pode provocar doença grave e incapacitante sensitivo-motora. O inicio dos sintomas começam aos 20-25 anos e caracteriza-se por Doença Hereditária Crónica e Progressiva. Ao substituir o fígado por outro, leva à queda abrupta da produção anormal desta proteína e à diminuição da sua deposição nos tecidos com melhoria dos sintomas e da sobrevida dos doentes.

O diagnóstico das doenças do fígado faz-se através da realização de análises clínicas e exames complementares ao fígado: Ecografia, TAC e Ressonância Magnética Nuclear. Por vezes para caracterizar melhor é necessário fazer uma biópsia do fígado.

Há situações, que poderão evoluir para "Falência Hepática Fulminante", nomeadamente pela ingestão de substâncias tóxicas ou medicamentos (Paracetamol) em doses muito elevadas ou medicamentos para tratar a tuberculose e alguns chás de ervanárias). A ingestão de cogumelos venenosos também pode evoluir para falência do fígado.

Após confirmação do diagnóstico para transplante o doente é inscrito num dos três centros existentes em Portugal, (Lisboa, Porto e Coimbra). O doente é avaliado por uma "Equipa multidisciplinar", que engloba vários especialistas (Cirurgiões, Hepatologistas, Gastroenterologistas, Psicólogo, Anestesista e Imunohemoterapêuta).

Se o doente for aprovado e tiver menos de 70 anos (a partir dos 70 anos a decisão é efetuada caso a caso) é inscrito numa "lista de espera" segundo o seu grupo sanguíneo. É informado que a partir desse momento pode ser chamado a qualquer hora do dia ou da noite.

O tempo de espera até à realização do transplante varia de acordo com a situação clínica do doente. Em média é de cerca de 6 meses.

A cirurgia dura cerca de 5 horas e após a realização do transplante, o doente fica um dia na Unidade de Cuidados Intensivos (UCI). Se não houver complicações terá alta hospitalar ao fim de 2 semanas.

Para evitar a "Rejeição" do novo fígado é necessário o doente tomar até ao resto da vida medicamentos chamados "Imunossupressores". É aconselhado a ser seguido em consultas regulares nos primeiros meses e depois uma a duas vezes por ano.

Ao fim de 6 meses o doente transplantado poderá iniciar a sua vida ativa quer profissional quer social, mantendo hábitos de vida saudável, (alimentação equilibrada, não ingestão de bebidas alcoólicas, exercício físico e uso de máscara em lugares muito frequentados).

Se viajar para o estrangeiro, deve ser portador de relatório clínico passado pelo seu médico e ter consigo sempre toda a medicação necessária.

Transplantar um doente é melhorar, sem dúvida, a sua qualidade de vida.

Um artigo do meu amigo Américo Martins, cirurgião reformado, que achei interessante partilhar. (Paulo Correia, julho 2023).