Olhar o Céu

06-01-2022

Fotografia de Fernando Pinto

Quando era pequeno passava muito tempo a olhar o Céu, particularmente à noite e sobretudo quando a iluminação em redor era menos intensa, distinguindo milhares de estrelas e até alguns planetas. Perscrutava também as constelações mais conhecidas, cuja eventual identificação apontava a familiares e amigos.

Em Outubro de 1957 com cinco anos, acompanhei pela rádio com o meu Pai a entrada em órbita da nave russa Sputnik 1, que se manteve a 200kms da Terra durante três semanas, enquanto as baterias o permitiram. Era um satélite pequeno (60 cms) com um formato em esfera, de onde emergiam 4 antenas que lhe desenhavam o rasto e que reproduzi inúmeras vezes nos meus cadernos de escola. Um mês depois, o Sputnik 2 levou ao espaço a cadela Laika, que tendo sobrevivido ao lançamento, morreu por sobreaquecimento durante a 4ª órbita. Mantive a sua foto por vários anos.

Intrigavam-me a distância e a velocidade a que tudo isto se passava, bem como a tecnologia que suportava todo o programa espacial, almejando poder tripular um dia uma nave que me permitisse percorrer aquele Céu lindíssimo e quase desconhecido.

E se conseguisse lá chegar, o que encontraria? Como voltaria à Terra?

Estava ávido de conhecimento. Comprei todos os jornais que relatavam o progresso das missões Apollo, criei álbuns que ainda mantenho, onde colei retalhos do Século, do Diário de Notícias, do Diário Popular, da Capital e algumas ilustrações coloridas das revistas Flama e Paris Match. Percebi desde muito cedo que se estava a escrever a história e eu queria estar bem documentado para a acompanhar e discutir.

A 20 de Julho de 1969 de férias com o amigo Jesus Ferreira na Costa da Caparica, assistimos pela TV à alunagem do módulo EAGLE, transportado pela Apollo 11, bem como, aos primeiros passos naquele satélite natural da Terra dados pelos astronautas Neil Armstrong e Buzz Aldrin. As imagens que nos chegavam eram muito pouco nítidas, mas a sensação foi excelente. Viemos para a rua olhar mais uma vez para a Lua e ver se conseguíamos identificar alguma coisa por lá a brilhar!...

Mais tarde concebi com um colega um pequeno foguetão que batizamos com as iniciais dos nossos nomes: ALMODIPE I (Aleixo Dias e Modesto Pereira), que testámos sem sucesso na praia da Trafaria. O engenho ainda percorreu uns metros, mas desintegrou-se em chamas, tendo nós fugido de bicicleta do local com medo de que pensassem que era alguma bomba.

Nunca deixei de olhar para o Céu. Julgo ser importante que dediquemos algum tempo do nosso dia a apreciá-lo. A maioria dos fenómenos que estamos a ver agora aconteceram há milhões de anos/luz e sempre que olhamos para lá, embora pareça igual, o Céu é diferente.

Também gosto muito das nuvens. São muito graciosas e compõem o fundo cénico do Céu, mesmo quando são escuras, o contraste que emprestam é magnífico.

Como paraquedista retenho a singular experiência de as atravessar em queda livre, sentindo no rosto um sopro de frescura indescritível. Estas formações resultam da condensação do vapor de água e flutuam sobre camadas de ar quente. Porém, quando a densidade da água aumenta, as gotículas ficam mais pesadas, e a nuvem desfaz-se em chuva. Não é fantástico?

Às vezes, quando viajo de carro ou de comboio, tento determinar a que altura as nuvens se encontram do solo (tecto), bem como, o seu volume e peso aproximados. É uma experiência engraçada.

O peso de uma nuvem resulta do produto da densidade pelo volume de água que contém. Por exemplo, uma nuvem cúmulos (aspecto branco, base plana, contornos salientes e desenvolvimento vertical), contém cerca de ½ gr de água por m3. Já as nuvens cinzentas-escuras, que pairam a mais baixa altitude e que trazem chuva, podem ter densidades muito mais elevadas.

Avaliando a extensão aproximada da base (sombra - quando o sol incide verticalmente sobre a nuvem, ou com o auxílio do odómetro do automóvel quando sob elas se viaja), bem como da sua altura estimada, chegamos ao volume. Depois é só multiplicar este valor pela densidade de água aí contida. Faça as contas e vai ficar espantado com as toneladas de água que pairam sobre as nossas cabeças!

À medida que envelheci, tornei-me demasiado absorvido pelo entorno do dia a dia (o trabalho, as pessoas, o lazer), mas nunca deixei de apreciar o Céu.

Costumamos reparar nele quando se põe nublado e escuro, abrigamo-nos quando chove ou troveja mas, normalmente, não mais do que isso.

Ocasionalmente somos surpreendidos por um radioso Arco-íris, como que a mostrar-nos como é linda a natureza.

Olhe para cima!

Há muito mais no Universo do que a vida assoberbada aqui na Terra.

Lá em cima as nuvens movem-se calmamente através do Céu e que há um Deus que de braços estendidos, espera por nós.

Talvez seja um caminho!


José Aleixo Dias (1)

(1) o autor escreve segundo o antigo acordo ortográfico