A vida são três dias... e dois já passaram
A vida são três dias e dois já passaram... e o que falta pode ser ainda o melhor!
Na Transições uma das nossas grandes preocupações é "chamar a atenção" para que quanto mais gostamos do trabalho que fazemos, da profissão que temos, mais difícil se torna passar à fase seguinte, ou seja ao último terço da nossa vida.
A reforma pode ser vivida na plenitude da nossa saúde, física e mental, bem como de forma equilibrada emocional e socialmente. Dizem os entendidos que para isso é necessário planear. Não estressar com o planeamento, mas de vez em quando pensar nisso a sério.
Deixamos aqui algumas dicas e "ponha-se a caminho".
Dica 1: Dedique algum do seu tempo a preparar-se para a reforma, enquanto ainda está a trabalhar. Este tempo que vai dedicar antecipadamente a pensar nos seus próximos anos parece ser um enorme investimento e pode ser o diferenciador entre "luta" e "sucesso";
Dica 2: Invista o seu tempo a pensar nos aspetos não financeiros da sua reforma. A seu tempo verificará que estes outros aspetos são mais importantes do que o dinheiro;
Dica 3: O passo mais importante é o de determinar que tipo de vida pretende ter nos anos em que vai viver reformado.
Há uma correlação direta entre o tempo que despendemos no planeamento da reforma e o sucesso que resulta para a sua vida futura como reformado. Aqueles que investem menos tempo tendem a ter uma maior probabilidade de sentir todos os problemas, de que muitas vezes ouvimos falar, tais como apatia, perda de identidade, depressão. Os que investem mais tendem a ter uma transição mais suave e um nível de satisfação mais elevado.
Tipicamente, as transições mais complexas são as dos "viciados em trabalho", que trabalham, e estão envolvidos, até ao seu último dia. O problema é ainda mais grave quando alguém é forçado a reformar-se sem ter antecipado essa situação, ou quando a mesma aparece como uma verdadeira surpresa. Infelizmente estes casos são bem mais comuns do que as pessoas pensam.
O objetivo de planear a reforma é determinar que tipo de vida pretendemos criar para nós próprios quando nos reformarmos, a fim de podermos ir implementado, passo a passo, as ações necessárias para chegar lá chegar tranquilamente.
A falta de planeamento não indica diretamente que a transição seja difícil e dura, mas significa que se tem de pensar nisso a sério e se deve pensar nisso agora! Há quem sugira aos 40, aos 50, eu diria que o limite para iniciar este planeamento são mesmo os 55 anos.
Se o tema lhe interesse, então aqui vai a sugestão de um primeiro "investimento em si". O artigo é longo, mas achámos que valia a pena.
Preparação para a reforma (I - evitar surpresas)
Qual a diferença entre quem se reforma e aproveita a vida e quem luta pela vida quando se reforma? A palavra-chave, diz a experiência, e recomendam muitos autores: preparação!
Primeira recomendação: nos seus últimos anos de trabalho, pense um pouco menos de tempo no seu trabalho e invista mais tempo a pensar na sua vida pós-trabalho.
Este trabalho de preparação evita algumas das consequências mais comuns:
Depressão - não é incomum ter uma sensação leve, de depressão, chamemos-lhe "mal-estar", quando passamos de uma vida estruturada, a do trabalho, para uma vida não estruturada, a da reforma.
Uma forma de se sentir melhor parece ser dar uma "nova" estrutura à sua vida. Comprometa-se com algumas coisas que obrigatoriamente colocará na sua agenda, por exemplo uma caminhada matinal, um desporto; telefonar/visitar alguém; assinar algumas newsletters; juntar-se a um grupo que tenha reuniões regulares; fazer voluntariado. Ou seja, preencha a sua agenda com algumas coisas de que goste, ache importante, e quer mesmo fazer.
Ter o seu tempo estruturado, nos primeiros anos de reforma, pode ser um bom passo para descobrir um novo propósito para a sua vida.
Tédio - Como sabemos, mesmo que gostemos muitíssimo do nosso trabalho, o mais natural é que um dia tenhamos que o deixar, ou por escolha nossa ou por qualquer outro motivo que esteja fora do nosso controlo.
E no fundo é decisão sua a forma como decide viver a sua vida. Sem nenhum plano, e sem o cuidado de desenvolver outros interesses para além do trabalho, é possível que sinta tédio.
No trabalho temos alguém a quem prestar contas, um chefe que nos diz o que é expectável que contribuamos. Mas na reforma é tudo diferente. O "chefe" somos nós. Nós definimos as regras, definimos a agenda, estabelecemos os horários.
Não se esqueça que antes de si já muitos outros passaram por esta transição, e poderá aprender se ler, ouvir, ou partilhar experiências com outros.
Fazer uma lista de interesses, ou de coisas que gostaria de fazer/cumprir, é um primeiro passo.
Fritz Gilbert, autor do livro "Keys to a successful retirement", preparou a sua vida pós -reforma de uma maneira interessante. Diz ele que tinham um "pote para as atividades na reforma". Começaram um ano antes da data prevista para a reforma. Quer ele, quer a mulher, iam colocando tiras de papel que iam escrevendo com atividades, coisas que gostariam de fazer quando se reformassem. Um ano mais tarde, tinham 104 tiras de papel, uma por semana, de cada um dos dois. Foi uma surpresa. E a cada semana passaram a tirar um papel e tentavam fazer o que estava escrito. Foi uma grande oportunidade para fugir ao tédio, para procurar atividades em comum, para estar ocupado, e para fazer coisas que nunca tinham pensado que podiam ser tão interessantes.
Perda de identidade - É uma das situações mais comuns. A verdade é que o que fazíamos nos definiu durante décadas. E de repente, vemo-nos confrontados com o nosso "eu". A sugestão é que deixemos de nos focar em quem éramos e passemos a focar-nos no que pretendemos ser.
Tal como o fizemos quando trabalhávamos, também agora é oportuno ter um atraente discurso preparado de forma a quando o nosso interlocutor nos coloque a questão habitual "então o que faz agora?" tenha a sua resposta pronta e na "ponta da língua".
Sobretudo evite aquela conversa, que não o ajuda nem a si, nem ao seu interlocutor, de que hoje está reformado, mas que quando trabalhava fazia isto e aquilo, era isto e aquilo. Nós não queremos viver no passado, queremos viver e aproveitar o presente, portanto "para a frente é que é o caminho".
Tristeza - Aparentemente acontece sobretudo às pessoas que não estavam preparadas, ou seja, quando a iniciativa não foi sua. Um daqueles dias em que nos chamam, e começam a falar da empresa, dos desafios, de quanto fomos úteis para a empresa mas, está na hora, de dar lugar a outros, de reduzir o número de trabalhadores, de extinguir a sua função, enfim...algo que nos deixa completamente surpreendidos. Só "quando nos cai a ficha" passamos para a fase, de zanga, ou de tristeza. Esta última é mais difícil de ultrapassar.
Perder o trabalho é um importante fator de stresse. É normal sentir-se em baixo, dê-se um tempo, não escolheu a situação em que se encontra, mas a escolha já é sua quando pensar em como se vai encontrar nos dias seguintes.
Resista à tentação de se afastar de tudo e de todos, o que acontece frequentemente quando sentimos o embaraço de ter perdido o emprego. A interação com outros é crucial para ultrapassar a tristeza, a dor, portanto quase diríamos que é uma prioridade falar sobre o assunto. Se for com alguém que já percorreu este caminho, e o ultrapassou com sucesso, tanto melhor. A partilha da sua experiência, os dias difíceis que pouco a pouco se foram tornando em dias tranquilos, e mais tarde numa sensação de liberdade e de sermos donos de nós mesmos, poderá representar uma luz ao fundo do túnel, mesmo que tenhamos de o percorrer.
Concentre-se em fazer alguma coisa que lhe agrade, e/ou que queria fazer há muito tempo e não tinha tido oportunidade, e veja esta sua nova fase como uma oportunidade para mudar a sua vida para melhor.
Preparação para a reforma (II - ideias que ajudam)
Se ainda não se reformou, a primeira coisa que aconselhamos fazer é que, enquanto trabalha, pense no que gostaria que fosse a sua vida quando se reformar.
Como temos vindo a referir há uma forte correlação entre o tempo que se "investe" no planeamento da nossa reforma e o sucesso que vamos ter nessa mesma transição.
Mas se já se reformou, também não vale a pena ficar desesperado só porque afinal a transição do trabalho para a reforma está a ser um pouco, muito, mais difícil do que imaginava. Nunca se esqueça que não há uma fórmula mágica que nos diga como vai ser, apenas o saberemos quando lá chegarmos.
No nosso entender há algumas coisas que podemos fazer e que ajudam a uma transição mais suave.
A primeira é, claramente, manter-se ativo. Nos primeiros tempos até pode apetecer não ter horas para se levantar, passar a vida no sofá, muitas vezes sem mesmo deixar o pijama. Tudo bem! Mas não se habitue, dê-se um tempo e não permita que a televisão, as séries, até mesmo a leitura ou a música, sejam os seus únicos amigos. Tem de se manter fisicamente ativo. Estudos demonstram que fazer exercício físico ajuda, ou mesmo ultrapassa, o benefício de se tomarem medicamentos para a depressão.
Fortaleça e crie novos relacionamentos pessoais, o que hoje muitos chamam "networking". Agende telefonemas, visitas, almoços, espetáculos. Convide alguém para ir consigo. Com a sua cara-metade, se também já está na mesma fase da vida, ou com amigos, do antigamente, ou que acabou de conhecer. Fale do que sente, do que está a viver. Partilhe, e oiça. Quem sabe do outro lado, ou estão na mesma fase ou já a ultrapassaram.
Foque-se mais nos outros e menos em si mesmo, sem obviamente deixar que os outros ocupem todo o seu tempo. Mas quando achamos que somos os únicos em determinada situação, não podemos estar mais enganados. Na mesma situação, ou noutra diferente, os outros, a quem agora prestamos mais tempo e atenção, revelam-se normalmente agradáveis surpresas. Vai-lhe acontecer, pensar ou dizer, com frequência "Ai, sim? não fazia ideia!". Sentir que estamos mais próximos e que ajudamos os outros é um sentimento que nos preenche e nos enche de satisfação.
Mas, muito importante, e por outro lado...
Não deixe que os outros "gastem" o seu tempo se sentir que a relação não trás benefício para ambas as partes. Não se deixe "consumir". Há pessoas que por mais que tentemos ajudar vão sempre ver a vida negra, vão sempre sentir-se os mais desgraçados, vão sempre ver o copo meio vazio, vão sempre achar que os problemas delas são insolúveis e os maiores do mundo. Defenda-se.
Mantenha uma agenda, tal como quando estava a trabalhar. Tenha rotinas, horários e tarefas a cumprir mas não tem de ter o dia completamente estruturado, claro, tem de colocar na sua agenda aquele tempo que é só para si. Se funciona melhor de manhã, comece cedo, com uma caminhada, indo ao ginásio, em resumo, mantendo-se fisicamente saudável. E deixe a tarde para as outras coisas que lhe dão gosto. Mas se o seu corpo funciona melhor a meio ou no final da tarde, pois adapte o seu horário nesse sentido. Tudo o que se pretende é que se sinta bem.
Use a sua liberdade de tempo para ser um pouco mais introspetivo; refletir, meditar, rezar, cada um sabe de si, são momentos que o vão ajudar a pensar em coisas para as quais não tinha tempo antes. E use também o seu tempo para fazer algo que realmente o entusiasma, que o faz sentir feliz quando acorda, e que sempre quis fazer. Valorize! Finalmente tem essa oportunidade.
Todas as pessoas passam por fases mais complicadas na vida, em vários momentos da sua vivência. Faz parte do processo. É importante que se reconheça este facto, que é normal, e que não há nenhum problema em se ter problemas. O que é importante é ultrapassá-los, como temos a certeza que o fez por várias vezes ao longo da sua vida.
Se mesmo assim continuar a sentir que vive em luta consigo mesmo e não se está a conseguir encontrar, não sofra em silêncio. Se precisar de ajuda não hesite em a procurar.
Na Transições não somos médicos, nem psicólogos, nem coaches, somos apenas pessoas que estamos a passar ou já passámos por esta fase da vida e é com gosto que partilhamos as nossas experiências e estamos dispostos a ajudar: www.transicoes.pt e geral@transicoes.pt
Teresa Marques
Bibliografia:
"The best is yet to be" - Mike Bellah, Ph.D. (2019)
"Retirement your way" - Gail M. Mc Donald & Marylyn L Bushey (2019)
"Keys to a Successful Retirement" - Fritz Gilbert (2020)
"How to retire Happy, Wild and Free" - Ernie J. Zelinski (2021)