Porque sou Fotógrafo

28-04-2021

O meu nome é Jorge e tenho 62 anos. Desde a minha formação, Engenheiro Eletrotécnico, até à minha vida profissional, sempre estive ligado à tecnologia, mais propriamente aos Sistemas de Informação.

Poder-se-á perguntar o que é que um homem das tecnologias tem a ver com a fotografia, nomeadamente a fotografia vista como uma forma de arte?

A resposta poderá estar em múltiplas influências, a começar pela influência paterna que, desde a minha tenra idade, me habituei a ver fotografar e filmar com o 'velhinho' filme de 8mm.

Comecei realmente novo a experimentar fazer fotografia mas confesso que, não só pelo preço que custava mandar revelar e imprimir na altura do analógico, como também outros interesses de quando somos jovens, acabei por colocar a fotografia em 'standby'.

No início dos anos 2000 começou o que considero uma revolução na fotografia, ou seja, o aparecimento do digital. A minha curiosidade pela tecnologia, assim como o bichinho da fotografia que estava adormecido, trouxe-me de novo para esta arte.

Posso então dizer que, (re)comecei em 2004 e, desde aí, tem sido um percurso cheio de descobertas, sobretudo de cariz emocional com o vivenciar de sensações visuais de profundo prazer, mas também de ensinamentos que estava longe de pensar que a fotografia me pudesse proporcionar.

Um aspeto a que hoje dou um valor muito grande ao ter-me interessado pela fotografia numa altura em que ainda estava a trabalhar, foi a transição suave que esta atividade me permitiu fazer na mudança da vida ativa profissional para a reforma, uma fase da vida em que existe uma grande alteração nos nossos hábitos, com tudo o que isso pode trazer de instabilidade à nossa vida pessoal, e até familiar. Não o fiz deliberadamente a pensar na reforma quando comecei há quase 20 anos, mas valorizo hoje muito esta opção.

Mas a fotografia deu-me muito mais coisas que, sem ela, possivelmente não as teria/tenho usufruído. Lembro-me de há alguns anos atrás, ainda quando estava a trabalhar, passei por tempos difíceis em termos familiares, tempos de grande stress e incerteza, e a fotografia serviu-me, nessa altura, como escape e refúgio que todos temos que ter em alturas difíceis na vida. Acho que funcionou melhor que muitos comprimidos para o stress!

Um outro aspeto muito interessante que descobri com a fotografia foi o olhar para o mundo que nos rodeia, paisagens, pessoas, situações do dia-a-dia, com 'outros' olhos. Começamos, instintivamente, a educar o nosso olhar para criar 'aquela' composição. Distribuir os elementos visuais de uma forma harmoniosa dentro da 'frame' virtual que está dentro da nossa mente. A ter um olhar mais atento e profundo sobre as coisas, que nos mostra os pequenos detalhes que nos fogem quando o olhar é apenas rápido e superficial.

A minha vontade de viajar, conhecer novos lugares, gentes, destinos, ganhou uma nova motivação porque temos vontade de registar esses lugares com o nosso olhar pessoal. E o mais fantástico é que, se fizermos um passeio conjuntamente com outro(s) fotógrafo(s) e fotografarmos os mesmos motivos, as fotos serão todas diferentes pois cada um tem o seu olhar. A beleza da criação da imagem.

E que dizer quando nos aventuramos a fotografar estranhos, seja na rua de uma forma não agressiva, ou mesmo em estúdio? Este tipo de fotografia, por experiência própria, e por relatos de outros fotógrafos, representa sempre um desafio acrescentado, pelo 'medo' da reação das pessoas, pela nossa própria inibição, pela crescente censura que existe atualmente devido ao receio que as pessoas têm de serem expostas nas redes sociais. No entanto existe o outro lado da moeda neste tipo de fotografia, que é a retribuição que sentimos ao interagirmos com estranhos e daí resultar uma agradável conversa, uma troca de afetos, por exemplo, pela oferta posteriormente de um retrato ao fotografado. E não pensem que é raro isso acontecer, se formos atenciosos e delicados, a recetividade das pessoas é elevada!

E muitas outras coisas poderemos descobrir com a fotografia, como o contar de uma história com um conjunto de fotos, ou mesmo de apenas uma foto. O importante é começar a experimentar e, para isso, não é preciso grandes equipamentos, o fundamental é o olhar e a sensibilidade do fotógrafo para fazer boas fotos. Porque as boas fotos nascem quando, em primeira instância, o fazemos para nós, para o nosso gosto. Depois é partilhar, mas primeiro é usufruir!

Para terminar nada melhor do que citar um dos Mestres, Henri Cartier-Bresson, que sintetizou maravilhosamente o que é a fotografia, e que disse: "Fotografar é colocar na mesma linha de mira a cabeça, o olho e o coração".

Jorge Gonçalves Silva