Já não há, mas... há

07-05-2022

A sociedade em que vivemos tem conseguido proporcionar-nos um razoável nível de vida. Com uma ou outra limitação, habituámo-nos a ter à mão o que normalmente precisamos. Porém, de repente, damos conta que já não existe a padaria onde costumávamos comprar o pão.

Que o lugar da dona Odete onde íamos buscar a fruta, os legumes e uma outra cousa que faltasse à última hora, encerrou.

Que o barbeiro onde levamos filhos e netos, já não existe.

Que no mercado local, as bancas de peixe reduziram-se substancialmente e já não se vende criação (galinhas, perus ou coelhos)

Que os talhos se reduziram substancialmente e que tenho dificuldade em encontrar caracóis, tremoços, azeitonas britadas ou ervas de cheiro.

Dou-me conta de que as bolas de Berlim que eram grandes e fofas e me deixavam as bochechas cheias de açúcar, parecem agora mirradas e anémicas.

A papelaria onde íamos de manhã comprar o jornal desapareceu, para dar lugar a uma loja de tatuagens.

Ainda é possível encontrar a bôla de Chaves por encomenda a 70 metros de onde vivo, mas creio que será "Sol de pouca dura".

O Mundo definitivamente mudou.


Se por um lado já não tenho que assistir ao espectáculo macabro de ver nos ganchos do talho cabeças de porco, ou frangos exangues, gostava de muitas das coisas que atrás descrevi e que desapareceram, ou se tornaram difíceis de encontrar.

Também a nível profissional é hoje mais difícil encontrar uma boa modista, um bom sapateiro, um electricista ou canalizadores experientes.

Já não há!...


Antigamente era necessária uma carteira profissional para exercer a actividade.

Agora qualquer gato sapato deita umas paredes abaixo, compra uns canos no Leroy e arvora-se em empreiteiro. Fazer bem, criar escola e deixar discípulos, acabou!...

Criámos ondas de doutores que não sabem pregar um prego, coser um botão, fazer uma refeição ou mudar um pneu.

Perguntem a qualquer um, como se faz massa de cimento? Como se usa uma grosa ou um formão? Como se usa uma sachola ou uma enxada? Já não há!...


Mas, ...há:

Um nível cultural mais desenvolvido

Uma logística instalada que permite trazer até nós qualquer produto de quase todo o Mundo.

Um maior investimento na I&D e fundamentalmente, uma maior preocupação com as desigualdades e injustiça social.

Uma maior sensibilização para as questões ambientais e preservação da natureza.

Uma maior partilha da informação e dos conhecimentos disponíveis.

Quero crer que, também, uma maior solidariedade entre Povos.

Lisboa, 20 de Março de 2022

José Aleixo Dias (1)

(1) o autor escreve segundo o anterior acordo ortográfico


Fotografia de Jorge Gonçalves Silva