Horas Extraordinárias
Nas nossas vidas, todos nós fizemos muitas. Aquelas que foram reconhecidas e de que recebemos algum retorno e todas as outras que nem por isso.
As horas dedicadas à criação, à reflexão, de dúvida sobre se seguíamos o caminho certo. As que nos tiraram o sono, que nos criaram angústia ou nostalgia e que nos cercearam o espaço familiar porque: "tínhamos que trabalhar!"
Pois bem! Não é dessas que vos quero falar aqui.
Venho falar-vos de outras.
De horas efectivamente extraordinárias porque nos permitem voltar a ter VIDA.
A acordar de manhã sem a preocupação de horários rígidos, de ir a correr para o emprego, de estar no aeroporto às 5.20 h da manhã, de aturar aquelas teleconferências enfadonhas, de almoços volantes promitentemente diarreicos, ou de aturar aqueles clientes execráveis.
Venho falar-vos de terem Tempo para Vós!
De se poderem dedicar ao que mais desejam.
De experimentar aquela brisa fresca pela manhã, ao exercitar uns passos pelo areal, ao tomar um café ou um sumo na esplanada, ao acompanhar os netos à escola ou de partilhar uma refeição com um familiar ou um amigo.
É também um tempo para uma reflexão interior.
Que oportunidades tenho de expandir a meu desejo de conhecimento?
Em que domínios a nossa experiência de vida pode constituir uma mais valia para terceiros, sendo simultaneamente gratificante?
Para quem está habituado a fazer tudo de véspera, agora é possível dar tempo ao tempo. Até é possível visitar pontos interessantes da cidade de eléctrico ou de autocarro, porque vamos fora das horas de ponta.
De repente damos connosco a olhar para o ar e a descobrir aspectos pitorescos em recantos por onde passámos centenas de vezes, mas íamos sempre de cabeça baixa, com pressa e com uma missão em vista.
Agora a missão é desfrutar!...
Organizamos retiros temáticos com visitas e debates a zonas de interesse no nosso País.
Experimentamos a aguarela, o óleo, o desporto ou a poesia.
Passamos ao papel as nossas recordações para que nos possamos divertir ao revivê-las e partilhá-las.
Aprofundar a genealogia até á enésima geração e descobrir que até tivemos um Conde na família ou que, fomos todos sempre muito pobres, com alguns filhos de pais incógnitos ou de padres que lhes chamaram... de Deus.
Meus amigos, agora já não vamos lá buscar. Pedimos que nos tragam!
Podemos dar-nos ao luxo de esquecer e de nos enganarmos, porque já ninguém repara.
Podemos ir assim gozando estas horas extraordinárias e de repente desaparecer, dizendo:
- Vou ali. Já venho!...
José Aleixo Dias [1]
[1] O autor escreve segundo o antigo Acordo Ortográfico