A alegria é uma escolha

16-03-2022

Falar de alegria, perante a guerra que se vive atualmente na Europa, pode parecer ofensivo. Afirmar que a alegria é uma escolha, poderá mesmo parecer um despropósito da minha parte. Onde está a alegria dos pais e mães dos soldados mortos em combate? Onde está a alegria dos refugiados ucranianos? Que escolha tiveram uns e outros?

Certamente que é difícil deslumbrar luz de alegria ou liberdade de escolha na noite escura em que o Mundo e a Europa mergulharam. Todavia, acredito que mesmo nas profundezas da maior desgraça e desesperança podemos sempre encontrar uma réstia de esperança e campo para semearmos de novo o grão da Alegria. Teremos para tal que escolher estar atentos quando ela nos sorri, escutá-la quando nos pede para reagirmos, viver em vez de morrer, abrir em vez de fechar, falar em vez de calar, partir em vez de ficar...

Não consigo imaginar a dor de ver um filho morrer ou de ver os sonhos de uma vida destruídos por um míssil. Não sei sequer se, e como, resistiria a tal dor. Mas, inspirado em tantos e tantos exemplos que a História nos relata, sei que me agarraria ao que esses heróis fizeram e procuraria imitá-los na escolha consciente e constante da busca da Alegria. Penso em tantas vítimas das guerras e do Holocausto, mas também nos refugiados ou nos milhões que lutam contra a fome e a pobreza extrema ou ainda nos que enfrentam doenças e provações que lhes causam sofrimentos inimagináveis. Inspiro-me nos relatos de muitos homens e mulheres que encontraram a luz da Alegria nas trevas do sofrimento e que o fizeram não apenas como modo de sobrevivência, mas também convictos de que ao fazê-lo estariam a combater o mal e a dor. E fizeram-no de forma consciente. Esses são os heróis e santos em que nos devemos inspirar.

E nós que não estamos em cenário de guerra e não temos fome? E nós, que apesar das imensas dificuldades e dores que temos carregado, nunca caímos na desesperança total e não batemos no fundo do abismo?

Como reagimos?

Deixamo-nos aprisionar pelos nossos sofrimentos ou, pelo contrário, cultivamos a alegria como forma possível e necessária para os superar?

Infelizmente, caímos demasiadas vezes na tentação da autocomiseração, do queixume e da vitimização. Ao fazê-lo, fechamo-nos sobre nós próprios, tornamo-nos infelizes e caímos num círculo vicioso de que é difícil sair. Se tal é compreensível em situações extremas como as que relatei, já me parece um absurdo quando o fazemos perante as nossas dificuldades do dia-a-dia, quando o fazemos como reação às ofensas, desatenções e injustiças de que somos alvo.

Tenho constatado, em contexto profissional, que esta incapacidade de escolher a alegria como opção para superar as dificuldades e obstáculos traduz-se muitas vezes em frustração, desinteresse, amargura, aspereza e desesperança... em suma, em falta de alegria. Quando as pessoas da minha equipa se queixam e se dizem tristes e desapontadas, gosto de as desafiar a olharem menos para si e para contextualizarem as suas dificuldades num contexto mais vasto... o da empresa, como um todo, ou o da cidade em que vivem e do Mundo que os rodeia. Sim, gosto sempre de comparar a nossa "falta de alegria" com a dos outros. Porquê? Porque em vez de pensarmos que o outro tem mais do que nós, é mais feliz do que nós ou tem mais sorte do que nós, percebemos que há muita gente que tem menos do que nós e é menos afortunada e feliz do que nós. Ao fazê-lo, vamos deixando crescer no nosso coração a semente da esperança, alegria e gratidão.

É importante estarmos atentos ao que a Alegria nos diz e entregarmo-nos ao que nos pede que façamos. Ao fazê-lo, relativizamos as nossas dificuldades e dores, semeamos a esperança e alegria nos nossos corações e, provavelmente, nos corações dos outros. Se encararmos a alegria como uma escolha, seremos certamente mais felizes, faremos o Mundo mais feliz e estaremos mais bem preparados para enfrentar a dor e o sofrimento que a vida nos causará.

Valorizar as dificuldades dos outros ajuda-nos a relativizar as nossas próprias dificuldades e a sermos pessoas mais alegres e felizes.

Diogo Alarcão


Fotografia de Conceição Balcão Reis