Manhãs azul-cobalto - Concha Balcão Reis
"Nougat" de Ana Paula Costa e Silva

Era uma noite fria de Inverno
Como são todas as noites de Natal
Regressávamos a casa
Quando nos abordaste a pedir ajuda
Teus olhos grandes suplicavam amor
Teu olhar profundo deu voz ao teu querer
Por não termos sido indiferentes à tua suplica
Recolhemos-te essa noite
Julgámos-te abandonado
Era isso que as costelas denunciavam
Sob o teu pelo desnutrido e baço
Interrompido
por diversas
e feias feridas
Mas o chip que transportavas contigo,
Meu querido Nougat,
Indicou que tinhas "dono"
E os procedimentos tinham de ser cumpridos
Contactado o proprietário
Vieram-te buscar
E lá foste de volta para a tua "casa"
Que mais não seria do que um parco canto no exterior
Mas tu és forte e assertivo
Sentiste o poder do amor e não o deixaste escapar
No mesmo dia que te levaram, voltaste
Sim,
De noite,
5 km percorridos, e ali
estavas tu
À porta, à nossa porta, à nossa espera
Percebemos o teu sofrimento
Confrontámos os "donos"
Nada do que tinha acontecido era normal
- O que é que se passa? Perguntámos
Tudo foi explicado
A chegada de um novo membro, um bebé
Tirou o teu lugar naquela família
Do interior do lar foste corrido para o quintal
Mas, por fim, praticaram um ato de amor
Pois abriram mão de ti
Deixando-te
partir e ser
feliz
Passaste a viver connosco
Como se nos conhecêssemos há anos
Temos de dar tempo ao tempo
O caminho far-se-á caminhando
A pouco e pouco
Irás aprender a brincar, a socializar
A correr na praia
Continuarás a enriquecer os nossos corações
Gravando o teu amor
Como simples pegadas na areia
E esta foi a verdadeira história,
Como, num volte face profundo,
Deixaste de ser Baltasar
Para passar a ser Nougat,
O
cão mais
doce do mundo.