Uma "quebrada" de xadrez

09-04-2022

O xadrez é um jogo que sempre me despertou curiosidade, mas para o qual sempre considerei que seria necessária muita concentração e aptidões que me parecia não ter. Creio que também haveria alguma preguiça de me dedicar a algo que, acreditava, careceria de muito tempo, o que talvez não tivesse pela dispersão de afazeres e atividades que me preenchiam. Certo é que o xadrez sempre povoou o meu imaginário, com bastante romantismo, algo "inatingível" mas desejado.

Quando a Transições promoveu as comunidades de interesses e a comunidade de xadrez tomou corpo, vi a oportunidade de iniciar-me neste jogo, do qual pouco sei, isto é, sei tão pouco que equivale a um nada para a prática.

Acreditei que agora reformada, teria tempo para me dedicar, mas a verdade é que muita coisa está a acontecer e ainda não consegui disciplinar-me para todos os dias me dedicar um pouco ou pelo menos com a frequência que me permita uma aprendizagem consistente.

Com os apontamentos que foram facultados, confirmei que vou mesmo precisar de muito tempo e de muita concentração. Não tenho grande afinidade com as tecnologias, reconhecendo o quanto podem facilitar, e procurei uma aplicação on-line, como sugerido. Não me entusiasmou para já. Sinto necessidade de mexer nas peças e de atuar em três e mais dimensões. A importância de tocar, de sentir o formato e o volume, de percorrer as colunas e linhas, de encarar o outro jogador, aquela dinâmica sensorial que não há ecrã que me transmita. E comprei um jogo, espantosamente em conta, e apesar de não ter adversário, é-me bem mais prazeroso e aliciante.

Está em cima da mesa de trabalho, e quando passo por lá ou estou à mesa a fazer qualquer coisa, miro as peças e tento recordar como cada uma se desloca, o seu valor, às vezes vou ver os apontamentos e realizo uma encruzilhada de movimentos, uns espontâneos, outros mais elaborados, e categoricamente ineficientes. Não jogo, mas ando divertida.

Comentei este namorico com uma pessoa amiga e fui atingida pelo omnipresente (e quase instantâneo) objetivo-sucesso "assim, nunca mais vais jogar!": xeque mate, pensei. E ri-me.

Não são partidas de xadrez, são "quebradas" de xadrez, mas com muita satisfação. E estou na expetativa daquela "quebrada" mais séria, digo partida frente a frente, com um adversário silencioso e calculista, de expressão hermética, como se vê nos filmes e nos jogos profissionais; aquele tempo em que parece que se fica suspenso, e a mão a cair sobre a campainha que acorda a "insustentável leveza do ser" para mais um momento de racionalidade.

Não jogo xadrez mas, entusiasticamente, quebro a cabeça. O peão é recruta.

Alexandra Carvalho